Só o tacanho espírito burguês, que considera absolutas e, portanto formas naturais eternas as formas capitalistas de produção, pode confundir estas duas perguntas - que é trabalho produtivo do ponto de vista do capital, e que trabalho é em geral produtivo ou que é trabalho produtivo em geral - e assim ter-se na conta de muito sábio, ao responder que todo trabalho que produza alguma coisa, um resultado qualquer, por isso mesmo, é trabalho produtivo.
Primeiro: Só o trabalho que se transforma diretamente em capital é produtivo; portanto, só trabalho que faz do capital variável magnitude variável e, em conseqüência, torna o capital total C = C + (124). Se o capital variável, antes de se trocar por trabalho, for igual a x, de modo a se estabelecer à equação y = x, é produtivo o trabalho que converte x a x + h e, por conseguinte faz y = x, y' = x + h. Este, o primeiro ponto a elucidar: trabalho que produz mais-valia ou que é força que permite ao capital criar mais-valia, assumir a figura de capital, de valor que cresce por si mesmo.
Segundo: As forças produtivas sociais e gerais do trabalho são forças produtivas do capital. Mas essas forças produtivas só concernem ao processo de trabalho ou só dizem respeito ao valor de uso.
Representam propriedades inerentes ao capital como coisa, seu valor de uso. Não influenciam diretamente o valor de troca. Trabalhem 100 pessoas em conjunto ou cada uma delas de per si, o valor de seu produto é igual a 100 jornadas de trabalho, seja qual for à quantidade de produtos em que se represente; isto é, não importa a produtividade do trabalho. De modo apenas, a variação na produtividade do trabalho influi no valor de troca:
Se a produtividade do trabalho, por exemplo, se desenvolve num ramo particular de atividade, digamos, não constitui mais exceção na tecelagem substituir os teares manuais pelos mecânicos, exigindo a produção de uma jarda de tecido por tear mecânico metade apenas do tempo requerido pelo manual, então 12 horas de um tecelão manual não representam mais um valor de 12 horas e sim de 6, pois agora o tempo de trabalho necessário se reduziu para 6 horas. Às 12 horas do tecelão manual só configuram 6 horas de tempo de trabalho social, embora ele trabalhe 12 como dantes.
Mas não é desse assunto que se trata aqui. Tome-se, ao contrário, outro ramo de produção, por exemplo, tipografia, onde ainda não se emprega maquinaria. Nesse ramo, 12 horas produzem tanto valor quanto 12 horas em ramos de produção em que a maquinaria tem desenvolvimento máximo. Por conseguinte, o trabalho que produz valor continua sempre a ser trabalho do indivíduo, mas se expressa na forma de trabalho geral. O trabalho produtivo - como trabalho que produz valor - confronta, por isso, o capital sempre na forma de trabalho da força de trabalho individual, do trabalhador isolado, sejam quais forem às combinações sociais de que participem esses trabalhadores no processo de produção. Assim, enquanto o capital representa perante o trabalhador a força produtiva social do trabalho, o trabalho produtivo representa sempre perante o capital nada mais que o trabalho do trabalhador isolado.
Terceiro: Se parecem ser propriedade natural do capital, oriunda, portanto de seu valor de uso, extorquir trabalho excedente e apropriar-se das forças produtivas sociais do trabalho, ao revés, parece ser propriedade natural do trabalho gerar as próprias forças produtivas sociais como forças produtivas do capital, e o próprio produto excedente, como mais-valia, autovalorização do capital.
É mister desenvolver agora esses três pontos e daí inferir a diferença entre trabalho produtivo e improdutivo.
Quanto ao primeiro ponto, a produtividade do capital consiste em contrapor-se ele ao trabalho convertido em trabalho assalariado, e a do trabalho, em contrapor-se aos meios de trabalho convertidos em capital.
Vimos que dinheiro se torna capital, isto é, dado valor de troca se converte em valor de troca que acresce a si mesmo, em valor adicionado de mais-valia, em virtude de parte dele transformar-se em mercadorias que servem de meios de trabalho para o trabalho (matérias-primas, instrumentos, em suma, as condições materiais de trabalho), e parte aplicar-se na compra de força de trabalho. Entretanto, não é essa primeira troca entre o dinheiro e a força de trabalho, ou a mera compra desta, que transforma o dinheiro em capital.
Essa compra incorpora ao capital o uso da força de trabalho por determinado tempo ou torna determinada quantidade de trabalho vivo um dos modos de existência, a enteléquia, por assim dizer, do próprio capital.
No processo de produção efetivo, o trabalho vivo se transforma em capital, ao reproduzir o salário - portanto, o valor do capital variável - e ainda gerar mais-valia; e por meio desse processo de transformação, a soma toda em dinheiro se converte em capital, embora à parte que varia diretamente seja apenas a desembolsada em salário. O valor se era igual a c + v, é igual agora a c + (v + x), o mesmo que (c + v) + x (125); quer dizer, a soma original de dinheiro, a magnitude de valor, expandiu-se, revelou-se valor que ao mesmo tempo se conserva e acresce. (Cabe observar aqui: a circunstância de só a parte variável do capital produzir acréscimo, em nada altera o fato de aparecer expandida, por meio desse processo, a totalidade do valor original, de ficar ela acrescida de mais-valia, de se transformar, portanto em capital toda a soma original de dinheiro. É que o valor original = c + v (capital constante e capital variável). No processo torna-se c + (v + x); o último termo é a parte reproduzida que surgiu pela transformação do trabalho vivo em trabalho materializado, transformação que é motivada e introduzida pela troca de v por força de trabalho ou por sua conversão em salário. Mas, c + (v + x) = c + v (o capital original) + x. Ademais, a conversão de v em v + x e, portanto, de (c + v) em (c + v) + x só pode ocorrer quando parte do dinheiro se transforma em c. Uma parte só pode transformar-se em capital variável, quando a outra se transforma em capital constante.)
No processo de produção efetivo, o trabalho se converte realmente em capital, mas essa conversão depende da troca originária entre dinheiro e força de trabalho. Só em virtude dessa conversão direta de trabalho em trabalho materializado pertencente não ao trabalhador e sim ao capitalista é que o dinheiro se converte em capital, inclusive à parte dele que assumiu a forma de meios de produção, de condições de trabalho. Antes, o dinheiro - exista na própria forma ou na forma de mercadorias (produtos) adequadas para servir de meios de produção de novas mercadorias - é capital apenas em si (126).
Só a apontada relação definida com o trabalho transforma o dinheiro ou a mercadoria em capital, e é trabalho produtivo o trabalho que, por meio dessa relação que mantém com as condições de produção e a que corresponde determinado comportamento no processo de produção efetivo - transforma dinheiro ou mercadoria em capital, isto é, conserva e acresce o valor do trabalho materializado, que se tornou independente em relação à força de trabalho. Trabalho produtivo é uma abreviação para designar o conjunto do re1acionamento e dos modos em que a força de trabalho figura no processo capitalista de produção. É da maior importância, porém, distingui-lo de outras espécies de trabalho, pois essa distinção exprime a especificidade da forma do trabalho sobre que repousam o modo capitalista de produção por inteiro e o próprio capital.
Trabalho produtivo, portanto é o que - no sistema de produção capitalista - produz mais-valia para o empregador ou que transforma as condições materiais de trabalho em capital e o dono delas em capitalista, por conseguinte trabalho que produz o próprio produto como capital.
Assim, ao falar de trabalho produtivo, falamos de trabalho socialmente definido, trabalho que envolve relação bem determinada entre o comprador e o vendedor do trabalho.
Embora o dinheiro nas mãos do comprador da força de trabalho - ou, se se expressa em mercadoria, os meios de produção e os meios de subsistência do trabalhador - só se torne capital por meio do processo, só neste se converta em capital, e essas coisas não sejam capital antes de entrar no processo, mas apenas se destinem a ser capital, são elas, entretanto, capital em si. São capital em virtude da forma autônoma com que confrontam a força de trabalho e esta as confronta, uma relação que motiva e assegura a troca com a força de trabalho e o processo daí decorrente da conversão real do trabalho em capital. Têm de antemão, em face dos trabalhadores, a destinação social que as torna capital e lhes dá o comando sobre o trabalho. Por isso, com respeito ao trabalho, são precondições na forma de capital.
Assim, podemos designar de trabalho produtivo o que se troca diretamente por dinheiro na qualidade de capital ou, apenas abreviando, o que diretamente se troca por capital, isto é, por dinheiro que em si é capital, tem a destinação de funcionar como capital, ou que, na qualidade de capital, enfrenta a força de trabalho. Na expressão trabalho que se troca diretamente por capital está implícito que o trabalho se troca por dinheiro como capital e efetivamente se converte em capital. A determinação do caráter imediato dessa troca é matéria que logo veremos mais de perto.
Trabalho produtivo é, portanto o que, para o trabalhador, apenas reproduz o valor previamente determinado de sua força de trabalho, mas, como atividade geradora de valor, acresce o valor do capital, ou contrapõe ao próprio trabalhador os valores que criou na forma de capital.
Fonte: Manuscritos econômicos Marx de 1861 a 1863